terça-feira, 13 de outubro de 2009

Circos vão deixar de ter animais. Está aberta a guerra

A nova lei proíbe a compra de uma vasta lista de animais para exibição nos circos. Famílias circenses preparam-se para a luta

(Por Marta F. Reis. In “Ionline.pt”, 13 de Outubro de 2009)

Mila tem quase 30 anos e já está na reforma. Passou a vida a fazer acrobacias no circo Dallas, agora é insubstituível. Desta vez o discurso não é do domador: uma portaria publicada ontem em Diário da República proíbe a detenção de animais de dezenas de espécies. Por motivos logísticos, os que já estão nas mãos de particulares e privados têm direito a um resto de vida descansada - só não podem acasalar. Contudo, as futuras compras estão fora de questão. A lei não engloba jardins zoológicos, instituições científicas e entidades autorizadas para produção ou conservação da natureza. Os principais afectados, perante um rol de animais banidos que inclui elefantes, leões, focas, avestruzes e incontáveis espécies de mamíferos, répteis e aves, não aparecem no documento: os circos com animais vão durar o tempo que restar de vida às suas estrelas de companhia.

"Qual é a diferença entre ter um leão ou um passarinho numa jaula?", dispara Victor Hugo Cardinali: 12 tigres, nove leões e dois elefantes.

Segundo o patriarca da conhecida família circense, a legislação que acaba de entrar em vigor em Portugal é única na Europa. "Sou membro da ECA (Associação Europeia de Circos) e apesar de já ter havido várias intenções, isto nunca foi para a frente em nenhum país. Nunca pedimos subsídios nem dependemos do Estado, mas agora vamos lutar pelo nosso trabalho."

Renato Alves, do circo Dallas (seis leões, e mais camelos, vacas da Mongólia, póneis e cavalos) só sabe da portaria pelo i. Os camelos escapam. "Registar é importante, sempre estivemos abertos às inspecções, mas um circo sem animais não é a mesma coisa", sublinha.

O fim do circo? O Ministério do Ambiente remete qualquer explicação para o Instituto de Conservação da Natureza (ICNB). Sandra Moutinho, do gabinete de comunicação do instituto, destaca que a nova lei tem em conta um período de adaptação de 90 dias, durante o qual devem ser referenciados os animais que ainda não tenham cumprido o registo obrigatório. Quanto à proibição de procriação - que levou o director do Circo Chen, Miguel Chen, a acusar o legislador de se ter esquecido de "mandar fabricar preservativos para os tigres, em declarações à Lusa - Sandra Moutinho adianta que não cabe ao ICNB ditar os métodos, embora adiante que "esterilizar ou separar os animais são duas opções".

A discussão está instalada. Entre os críticas, Cardinali é determinante: não vai esterilizar. Os circos que vêm de fora têm de informar-se. Não está previsto nenhum acompanhamento especial para a entrada em vigor da nova legislação. "As inspecções já existem neste momento através dos serviços de controlo dos circos. A fiscalização passa também pelas câmaras e pela GNR", diz Sandra Moutinho.